A jornalista é também mestranda do Programa Multidisciplinar de Pós-Graduação em Cultura e Sociedade da Universidade Federal da Bahia e pesquisadora em gênero e mídia do grupo Miradas Femininas. Seu texto, publicado na seção Tendências/Debates da Folha (para assinantes), aborda a interessante distorção ocorrida na história do tal dia 8 de março.
Quase todo mundo já ouviu a história do incêndio que matou mais de uma centena de mulheres numa empresa têxtil nos EUA, evento que seria relembrado com o Dia Internacional da Mulher. Porém, como Adriana Carneiro apresenta, este incêndio envolve uma série de particularidades. Primeiramente, ocorreu em 25 de março de 1911 e vitimou 146 pessoas, sendo 123 mulheres. O incêndio foi causado por um cigarro aceso numa área repleta de tecidos e as mortes ocorreram porque as saídas de emergência estavam trancadas. Este incidente levou a fortes protestos em nome de melhores condições de trabalho das mulheres E dos homens. Além disso, reparem que a data, a não ser pelo mês não há coincidência com o atual 8 de março.
Por outro lado, a Adriana J. Carneiro lembra que já era comemorado um dia da mulher dentro do movimento socialista. No 2o. Congresso Internacional de Mulheres Socialistas, em 1910, havia sido proposto um dia de comemoração para lembrar, especialmente, a luta pelo direito de voto.
Contudo, o mais interessante estava por vir e para contar isso prefiro deixar para a própria autora:
Para compreender a escolha do 8 de março, remontamos ao dia 23 de fevereiro de 1917, 8 de março no calendário gregoriano. Naquela ocasião, as mulheres de Petrogrado, convertidas em chefes de família durante a guerra, saíram às ruas, cansadas da escassez e dos preços altos dos alimentos. No dia seguinte, eram mais de 190 mil.Observem as implicações políticas e ideológicas envolvidas em uma mera data comemorativa e que, hoje, pouco representa para a maior parte das mulheres. O contexto de luta original e mesmo a luta que se queria ver reforçada pela comemoração foi superado pelo tempo, mas antes disso havia sido superado pela força da disputa ideológica no contexto da Guerra Fria. Comemorar uma conquista ligada à Revolução Russa não era aceitável para o mundo ocidental capitalista, independente da conquista em questão.
Apesar da violenta repressão policial do período, os soldados não reagiram: ao contrário, eles se uniram às mulheres.
Aquele protesto espontâneo transformou-se no primeiro momento da Revolução de Outubro. A proposta de perpetuar o 8 de março como Dia Internacional da Mulher foi feita em 1921, em homenagem aos acontecimentos de Petrogrado.
Mas, sobretudo após a Segunda Guerra Mundial, em decorrência dos interesses do poder no período, seu conteúdo emancipatório foi se esvaziando. No fim dos anos 1960, a data foi retomada pela segunda onda do movimento feminista, ficando encoberta sua marca comunista original. Em 1975, a ONU oficializou o 8 de março como o Dia Internacional da Mulher.
("Origens do Dia Internacional da Mulher" , Adriana Jacob Carneiro. In: Folha de S. Paulo, 08.03.2011)
E por último, mas não menos importante, é bom lembrar que o dia 8 de março não é mais um dia das mães disfarçado...
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Segundo o dicionário, liberdade de pensamento é o "direito que cada um tem de expor suas opiniões, crenças e doutrinas", e este direito é garantido aqui. No entanto, qualquer comentário sexista, racista ou de algum modo ofensivo será apagado.