quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Um texto antigo

Em 2008 eu escrevi um pequeno texto sobre música e estudos musicais, mas poderia ser um texto apenas sobre estudo, de forma ampla. Como acredito que o texto continua válido, resolvi posta-lo aqui sem mudar muita coisa.

Espontâneo e com estudo
Ontem estava conversando com um amigo que, assim como eu, adora música. Com a diferença que ele é músico, e não apenas um ouvinte curioso.

Papo vai, papo vem, nos vimos conversando sobre post-rock. Depois do usual "você conhece tal grupo?" e "já ouviu tal projeto?" discutimos a falta de uma cena post-rock brasileira. Temos alguns bons grupos como Hurtmold ou Constantina, mas acho que não conseguiríamos listar dez desse tipo. A conclusão foi que músico brasileiro não estuda, e pra tocar post-rock precisa estudar.
Naquele mesmo dia eu tinha comprado a Rolling Stone (n.17), mas não tinha tido tempo de ler. Dentro tinha uma pequena entrevista com Gilberto Gil. Li a seguinte declaração:
Sempre fui desencorajado pelos mestres que tive. Me disseram: Não estude música, não faça escola, você é uma espontâneo, um intuitivo. Se você for pra escola, o risco é muito grande que você se perca naquelas opções acadêmicas.

Eric Satie (1866-1925)

Na hora pensei com meus botões, vivemos num país engraçado. O suposto talento nato é hipervalorizado e o estudo é posto em suspeita. Mas o mais curioso é que parece ter uma diferenciação. Música clássica, jazz, blues, choro e bossa nova exigem estudo; rock, samba, pagode ou qualquer pop não exige; e MPB estuda quem quer. Ou seja, viva o Naïf, viva a música com cara de artesanato hiponga, viva a composição com jeito de escultura de durepoxi vendida na Praça da República.
Só pra ilustrar o oposto um pouquinho da história de um precursor: Eric Satie. Considerado o pai da música ambiente e influenciador da música minimalista, Satie também foi um pianista de segunda ordem e dono de uma figura rock-star antes do rock: gostava mais do cabaré que da sala de concertos. Como todo artista de final de século XIX e início de XX entrou em um conservatório de música ainda adolescente. Sem grande futuro como pianista e consciênte disso, passou a compor pequenas peças para piano, músicas de 5 minutos ou menos. Bem diferente de seu amigo Claude Debussy, grande compositor nos moldes da época. Aos 40 anos Satie resolveu voltar a estudar porque achou que deveria se aprimorar, afinal continuava se achando mediano. Alguma opção acadêmica o prejudicou? Parece que não...

Talento é ótimo, mas estudo ainda é melhor.

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