sexta-feira, 18 de junho de 2010

Recife e o Manguebeat

Na aula "especial" de hoje sob a temática da Semana do Meio Ambiente do Colégio abordei a urbanização do Recife (PE) e seus problemas sócio-econômicos e ambientais, tomando como fio condutor a cena Manguebeat. O assunto ainda não acabou, vai continuar na segunda-feira, mas para quem ficou interessado em saber mais posto aqui um link e um documento (sim, os documentos históricos podem ser muito recentes!).

Primeiro o link, ou os links. Há um texto simples, mas bem interessante, de Rejane Calazans intitulado Do Mangue ao Manguebeat. Mas a autora mantinha ainda um BLOG, o Na Lama, feito para acompanhar a produção de um documentário sobre o Manguebeat. Não tive tempo de ler o material todo, porém a reunião de vídeos, textos, teses acadêmicas e notícias de eventos entre 2007 e 2009 formam uma base riquíssima para quem se interessa pelo assunto.

Já o release-manifesto encartado no álbum Do caos à lama (1992) está espalhado pela rede. Até no portal G1 vocês encontram. Mas, para facilitar, segue o texto.
Fiquem atentos na hora da leitura. O manifesto é rico em referências, verifique se o que você acha que entendeu é de fato o que o autor, Fred 04, quis dizer.

Manifesto “Caranguejos com cérebro”

Mangue, o conceito.
Estuário. Parte terminal de rio ou lagoa. Porção de rio com água salobra. Em suas margens se encontram os manguezais, comunidades de plantas tropicais ou subtropicais inundadas pelos movimentos das marés. Pela troca de matéria orgânica entre a água doce e a água salgada, os mangues estão entre os ecossistemas mais produtivos do mundo.
Estima-se que duas mil espécies de microorganismos e animais vertebrados e invertebrados estejam associados à vegetação do mangue. Os estuários fornecem áreas de desova e criação para dois terços da produção anual de pescados do mundo inteiro. Pelo menos oitenta espécies comercialmente importantes dependem do alagadiço costeiro.
Não é por acaso que os mangues são considerados um elo básico da cadeia alimentar marinha. Apesar das muriçocas, mosquitos e mutucas, inimigos das donas-de-casa, para os cientistas são tidos como símbolos de fertilidade, diversidade e riqueza.

Manguetown, a cidade
A planície costeira onde a cidade do Recife foi fundada é cortada por seis rios. Após a expulsão dos holandeses, no século XVII, a (ex)cidade “maurícia” passou desordenadamente às custas do aterramento indiscriminado e da destruição de seus manguezais.
Em contrapartida, o desvario irresistível de uma cínica noção de "progresso", que elevou a cidade ao posto de "metrópole" do Nordeste, não tardou a revelar sua fragilidade.
Bastaram pequenas mudanças nos ventos da história, para que os primeiros sinais de esclerose econômica se manifestassem, no início dos anos setenta. Nos últimos trinta anos, a síndrome da estagnação, aliada a permanência do mito da “metrópole” só tem levado ao agravamento acelerado do quadro de miséria e caos urbano.

Mangue, a cena
Emergência! Um choque rápido ou o Recife morre de infarto! Não é preciso ser médico para saber que a maneira mais simples de parar o coração de um sujeito é obstruindo as suas veias. O modo mais rápido, também, de enfartar e esvaziar a alma de uma cidade como o Recife é matar os seus rios e aterrar os seus estuários. O que fazer para não afundar na depressão crônica que paralisa os cidadãos? Como devolver o ânimo, deslobotomizar e recarregar as baterias da cidade? Simples! Basta injetar um pouco de energia na lama e estimular o que ainda resta de fertilidade nas veias do Recife.
Em meados de 91, começou a ser gerado e articulado em vários pontos da cidade um núcleo de pesquisa e produção de idéias pop. O objetivo era engendrar um *circuito energético*, capaz de conectar as boas vibrações dos mangues com a rede mundial de circulação de conceitos pop. Imagem símbolo: uma antena parabólica enfiada na lama.
Hoje, Os mangueboys e manguegirls são indivíduos interessados em hip-hop, colapso da modernidade, Caos, ataques de predadores marítimos (principalmente tubarões), moda, Jackson do Pandeiro, Josué de Castro, rádio, sexo não-virtual, sabotagem, música de rua, conflitos étnicos, midiotia, Malcom Maclaren, Os Simpsons e todos os avanços da química aplicados no terreno da alteração e expansão da consciência.
Bastaram poucos anos para os produtos da fábrica mangue invadirem o Recife e começarem a se espalhar pelos quatro cantos do mundo. A descarga inicial de energia gerou uma cena musical com mais de cem bandas. No rastro dela, surgiram programas de rádio, desfiles de moda, vídeo clipes, filmes e muito mais. Pouco a pouco, as artérias vão sendo desbloqueadas e o sangue volta a circular pelas veias da Manguetown.



P.S.: Os bonitões que ilustram o post são os pais da criança. Primeiro Chico Science e, no Manifesto, Fred 04, mente por trás do Mundo Livre S/A.

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