Há um certo mito de que o rigor destes treinamentos fortalece o soldado e o prepara melhor para o combate, razão de ser das Forças Armadas. É verdade que o militar não está ali para fazer exercícios como na aula de Educação Física do colégio, mas tenho minhas dúvidas de como humilhações, falta de água ou, muitas vezes, práticas idênticas à tortura, fazem de um jovem aspirante um soldado superior.
Além disso, há ainda a crença de que se trata de um ritual de passagem, algo como um batismo. Depois de superar esta fase o indivíduo será finalmente aceito em sua nova vida. É a mesma lógica do trote universitário e, justamente por ser entendido como um rito obrigatório, acaba se perpetuando. "Neste ano fui humilhado para ser aceito, no próximo humilharei o calouro". Esta batismo violento me assusta particularmente nos caso de profissões que lidam com gente em seu cotidiano. Qual a tolerância à violência ou o descaso com a vida humana que terá um jovem médico ou policial?
Em todo caso, o episódio recente da Marinha me fez lembrar outro acontecimento da mesma corporação, mas há 100 anos.

As reivindicações acabaram atendidas e os marinheiros anistiados pelo Congresso Nacional, porém uma revolta de fusileiros logo tempo depois "permitiu" que a Marinha fizesse o que antes não tinha sido possível. Reprimiu violentamente os fusileiros da vez e os marinhos da revolta passada.
Da Revolta da Chibata sobraram a memória de seu principal líder João Cândido, o "almirante negro", e a sensação de que depois de 100 anos a Marinha ainda acredita que disciplina se consegue com violência.
Para ler +
Revolta da Chibata: 100 anos
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O marinheiro bordador
Duas toalhas de rosto bordadas pelo líder da Revolta da Chibata mostram os valores que defendia e revelam um pouco de seus afetos, sua dor e sofrimento
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Revolta da Chibata
Post antigo sobre a exposição virtual organizada pelo Arquivo Público do Estado de São Paulo.
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